terça-feira, 18 de setembro de 2012

A POSSIBILIDADE DO MULTIVERSO

É bom começar explicando esse título que, sem dúvida, deve parecer estranho aos não especialistas.

A ideia é que nosso Universo (com "U" maiúsculo) é só um entre uma multidão de outros universos, todos parte de um multiverso que pode ter existido por toda a eternidade.

Com isso, o que chamamos de Big Bang seria apenas o evento que marcou o início da nossa narrativa cósmica. Outros universos teriam os seus big bangs e as suas histórias.

Existem vários tipo de multiverso, mas todos têm essa característica em comum, de serem genitores de universos. Por exemplo, algumas teorias sugerem que as leis da natureza podem variar de região a região no multiverso. Nesse caso, diferentes universos poderiam ter diferentes leis da física. No momento, essas teorias são mais metafísicas do que físicas.

Em outras teorias, os diferentes universos têm as mesmas leis, mas as constantes da natureza (a massa e a carga do elétron, a massa do próton, a constante que determina a intensidade da força da gravidade etc.) é que variam.

Esta última hipótese vem da teoria de supercordas, a tentativa de construir uma teoria de todas as forças da natureza (são quatro ao todo), a chamada "Teoria de Tudo".

No momento, não temos qualquer indicação de que o multiverso possa existir. Ou, se existir, se poderemos determinar sua existência. É possível que exista apenas o nosso Universo e ponto final. Porém, se for este o caso, temos o problema de explicar por que esse Universo e não outro. Especialmente se levarmos as previsões da teoria de supercordas a sério e concluirmos que o multiverso é inevitável e que um número enorme de universos existe, cada qual com suas constantes físicas e, portanto, com uma física diferente.

Universos como o nosso são comuns entre eles ou raros? Como determinar isso?

Uma resposta óbvia é que, se nosso Universo não existisse, não estaríamos aqui nos perguntando sobre sua existência. Ele existe e pronto. Mas essa resposta não é muito satisfatória, pois estamos programados para buscar explicações finais, narrativas que justifiquem o começo, o meio e o fim de uma história.

É difícil imaginar algo que não tenha tido um início, como o temos nós e todas as formas de vida. Mais difícil ainda é imaginar que algo possa surgir sem uma causa inicial.

A existência ou não do multiverso, para que seja uma questão científica e não filosófica ou teológica, precisa ser determinada experimentalmente, por alguma observação.

No momento, existem tentativas de fazer isso, estudando o efeito sobre dois universos vizinhos que tivessem sofrido uma colisão no passado. Infelizmente, esses modelos ainda são bem simples, e está faltando muita coisa.

Um dos problemas que a ciência enfrenta com esse debate é a questão do infinito. Se teorias afirmam que o multiverso existiu e existirá para sempre, como comprovar isso? Mesmo com o nosso Universo e seu futuro: para determinar se ele existirá para sempre, precisaríamos de um experimento que durasse também para sempre.

A crise aqui vem da colisão entre conceitos como o infinito e as limitações concretas da passagem do tempo da qual a ciência, enquanto obra humana, prescinde.

Marcelo Gleiser é professor de física e astronomia do Dartmouth College, em Hanover (EUA). É vencedor de dois prêmios Jabuti e autor, mais recentemente, de "Criação Imperfeita". Escreve aos domingos na versão impressa de "Ciência".

Fonte: Folha de São Paulo.

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